PORTA FÁCIL É A ÚNICA PORTA

quarta-feira, dezembro 13, 2017


Seu pé pisa no assoalho envelhecido da minha entrada, ultrapassa o rodapé e empurra um pouco mais o acesso pontuado por rachaduras – por onde entram as luzes – e facilidades. Sim, facilidades. Mas sempre que sua sola faz barulho ao aportar na porta, você recua, ri torto, balança a cabeça e esconde os olhos. Por vezes, parece julgar o fato de não ver chaves, fechaduras, dobra-duras. Então, enquanto ainda está parado em análises, empurrando tapetes em implicitudes, deixe-me pontuar o que é elementar antes que escancare a abertura.

O primeiro detalhe fundamental que tenho a deixar como sirene gritante, bem aí na ponta dos seus dedos, é que: só entre se estiver valorizando essa tal da facilidade. Charadas e retrocessos não são atrativos para quem acorda lembrando que o raro só é raro para quem aceita o pouco como muito; para quem aplaude o básico. A cada vez que seus calcanhares batem em retirada pelos sustos próprios e pela sede do mistério, mais a greta vai ficando menor, mais a minha facilidade vai ficando mais fi, sem cá, só com ando. Porque o que atrai quem quer transbordar, é o poder caber.

O que atrai quem não se contenta com menos do que o respeitoso, o justo, o básico, é o fácil. Só o que é fácil demonstra esforço, porque nada é fácil até que haja o desejo de criar os recursos. E só o que cria prontidões é válido para o que está pronto para estar. Aviso, desde então, que aqui não tem mais espaço para imaturos. A maturidade do sentimento é feita automaticamente por ele mesmo, sem professores; pelo simples fato de que a única forma de sentir que existe é a de doar e o único jeito que faz a ligação dar certo, é ligando. É discando, é fazendo. É quando faz sentido, quando faz – ficando ou indo: com caráter.

Não estou dizendo que vou ser simples em uma totalidade, que vou, assim, de cara, ser barata – sem inseticida –, mas é questão de estar disposta a desembaraçar. Pode – e vai – ter um montão de montanhas, afinal, se não tiver, é porque não está olhando direito e, se não está olhando direito, é porque não está sentindo de fato. Mas tropeçamos é nas pequenas pedras. Montanha a gente escala. Faz o que é ex calar, guarda mala no bolso e sobe valorizando mais o caminho do que os topos, porque os tropeços são feitos de paz, mesmo nas quedas, quando são para serem fáceis.

E só é fácil o que é honesto. O que acha que a-guardar e omitir é não magoar, acaba magoado, acaba. Mata a base do edifício, faz tudo cair. Acaba sem nada, sem montanha, sem legado, destrói todo o caminho escalado e ecoa naquela rua o lembrete de que só o que é suficiente é o que deixa o querer mais. Suficiente é o que é franco, franco é o que é penteado. É o prato com garfo e faca, ainda que com a opção de comer de mão. A partir do momento em que você chegou aí, onde está parado agora, foi porque eu permiti que fosse fácil. Só aceito o que no for, é-ser.

Esse negócio de dizer que o que vem fácil, vai fácil, é um gigantesco levantar de muros, é puro embaraço. Só ocorre assim para quem não rega depois de receber a horta, para quem viu a facilidade inicial de algo como aviso de não indispensabilidade da dedicação. E, para ser fácil, de fato, é justamente o contrário requerido. O amor, só é amor, se construir fácil. A paixão, só é paixão, se voltar fácil. O talento, só é talento, se fluir fácil. O encanto, só é encanto, se nascer fácil. O prazer, só é prazer, se durar fácil. O fácil é o único tipo de pé que faz valer a caminhada nas pedras. O que pede demasiado ardor e vem com um apanhado de barreiras, só é tesouro se, no fundo, ou melhor, no caminho, desembaraçar fácil. Paciência somente para o que der paz e ciência.

Quero um dia dos finais de semana para cama com filmes e a liberdade sentida por poder apertar. É necessário o equilíbrio com as saídas, com o abraço dos amigos, com as folias de mãos dadas, mesmo sem o outro estar. Quero demonstrações berrantes, lembrete de que o orgulho nos dá desejo de fazer propaganda. É necessário que eu defenda você e vice-versa; e que as broncas sejam dadas reservadamente, a não ser que o outro cause algo ainda maior do que o amor: o irreconhecimento – por uma decepção. É preciso que tenhamos nossos limites combinados, analisados e resolvidos e, só quebrados, após uma conversa sobre reformulação do contrato.

É necessário que todas essas regras sejam condutas espontâneas, que seja possível brigar sabendo que isso não vai ser motivo para que haja o abandono das juras. É necessário que não haja a sensação de estar seguindo tópicos, prisões, obrigações. Por isso, senta aí mesmo, toca no chão, na frente do tapete de bem-vindo, e vamos papear sobre o que é fundamental para mim e o que é inadmissível para você. Depois, se formos um único bar-co, vamos engolir mar. Porque só assim poderemos respirar.

Os limites vão se moldando, se acrescentando, matando o se. Mas é preciso, desde agora, percebermos, antes que arrombe os portões, se eles podem, de fato, estar em alinhamentos, com facilidade, sem fadigas prontas para asmas. Até porque, se depois de assinados, você não arrombar a porta e não me deixar arrombar a sua, pode virar as costas e ouvir o cadeado. Quem fica devagar, não está em canto nenhum e não conquista nada.

Só venha se for para lembrar que maturidade é ser urgente quando se trata de relação, de real ação. Só venha se não for para recuar os pés outra vez por motivos solistas e por julgamento sociais, se for para vir com todos os personagens que compõem você em um único, porque só assim vai ver a minha total acessibilidade também. Só venha se for para tudo ser conversa fluindo, pesando por segundos, nunca por desonest-idades (elas são eternas). As incompatibilidades merecem, até, talvez, uma tentativa, mas só se for para ser em conversas incansáveis até que haja o com, o be e o nado. Só se for para ser sem maior suor de uma das partes. Se assim acabar sendo (com um quase morrendo), saberemos da precisão do adeus.

Ser fácil é dançar dos dois lados sem largar os passos de cor do próprio. A complicação irreversível é a do engano. O truque para segurar, é deixar tudo em liberdade para escolhas através da própria verdade que emite – e ela só existe, se vier, sim, com cobranças. De resto, é sensato demais, comedido demais, estabilizado demais. E, então, é falso demais. De resto, é difícil. O difícil nunca arromba a porta, porque só se arromba porta aberta, nenhuma outra pode ser quebrada, nem mesmo com simpatia e ludibriação. A porta aberta é casa, e casa não é caça. Caça nunca vai ser amor. E, só entra aqui, quem não tem arma, só dura.

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22 COMENTÁRIOS

  1. Brunt, suas palavras são tapas na cara da sociedade, sempre. Obrigada por tantos ensinamentos. Eu queria tanto mandar esse texto pra uma pessoa, pra ver se acorda!

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  2. que texto mais lindo, realmente ,com mts tapas na cara cheios de verdade!

    www.tofucolorido.com.br
    www.facebook.com/blogtofucolorido

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  3. Saudade de ler os seus textos Vanessa, sempre tão intensos e bonitos. <3

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  4. Incrível, Van! E é a mais pura verdade e reflexão. O que é fácil, já está aberto, não tem muito o que se explorar e aí se torna cansativo e tedioso. O que é difícil está trancado a mais de sete chaves, mas depois que é aberto, tem muito o que ser explorado e muita coisa para descobrir. Adorei a crônica!
    Beijos!

    www.likeparadise.com.br

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  5. E por que será que as pessoas só querem o que está ali pertinho, não é? A maioria quer o fácil, não quer ter o trabalho de conquistar.

    Abraços,
    Naty
    http://www.revelandosentimentos.com.br

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  6. Brunt, você é a melhor poetisa que já li na vida. Não estou fazendo exageros. As mensagens que você passa quebram tantos clichês e nos abrem olhos para sermos pessoas melhores, maiores, mais sensíveis. E, cara, falta isso, falta gente que facilite! E que entenda que o fácil é a única forma de dar certo: sem essa coisinha de mistérios, de jogos, de complicação. Como você mesma afirma, quem complica, não quer, não é?

    "Esse negócio de dizer que o que vem fácil, vai fácil, é um gigantesco levantar de muros, é embaraçar. Só ocorre assim para quem não rega depois de receber a horta, para quem viu a facilidade inicial de algo como aviso de não indispensabilidade da dedicação. E, para ser fácil, de fato, é justamente o contrário requerido. O amor, só é amor, se construir fácil. A paixão, só é paixão, se voltar fácil. O talento, só é talento, se fluir fácil. O encanto, só é encanto, se nascer fácil. O prazer, só é prazer, se durar fácil. O fácil é o único tipo de pé que faz valer a caminhada nas pedras. O que pede demasiado ardor e vem com um apanhado de barreiras, só é tesouro se, no fundo, ou melhor, no caminho, desembaraçar fácil. Paciência somente para o que der paz e ciência" FOD*

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    1. Bru, como faço pra esmagar você? Serve um abraço virtual eterno? Ai, que lindeza ler cada uma dessas palavras, sentir cada pedaço dessas entrelinhas, mergulhar em cada parte das suas emoções que estão em misturas e trocas evolutivas com tudo o que saiu daqui de dentro. É tão maravilhoso sentir que meu coração dá mãos para o seu e que viram um tão maior assim. Obrigada e obrigada por dar ainda mais sentido para este espaço, para cada partilha, para sermos sem quases. Que seja desembaraçado! Que desembaracemos e fiquemos no que sabe facilitar, sim.

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  7. Não sei escolher qual frase mais me impactou. Tu és demais! Que obra!! Mas esse último paragrafo foi o que já deixei aqui no bloco de notas. Que seja fácil, como tu disseste no Instagram e em toda essa arte

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  8. Eu penso que tudo que vem fácil, vai fácil e a gente não tem o sabor de dizer: Lutei, suei e venci. As coisas mais difíceis quando conquistadas tem o melhor sabor do sucesso.

    Big Beijos,
    LULU ON THE SKY

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    1. Oi, Lu! Que vontade de abraçar você um montão! Saudade de sentir seus mergulhos por aqui. Obrigada por trazer suas palavras e sua concepção. Espero, no entanto, que possa ler as palavras que tirei do emaranhado da minha garganta. O que faço, mais acima é, justamente, quebrar um pouco dessa visão que você pontuou. Como falei também com a Thami: o fácil pode já estar aberto, mas jamais vai prosseguir como tesouro caso não seja regado, valorizado. A facilidade em uma relação, seja consigo, no trabalho ou no amor, requer esforço para prosseguir como tal, requer entrega. Por esses pontos e quebras de paradigmas e clichês que desvalorizam as importâncias das facilidades foi que passeei ao escrever. O melhor sabor do sucesso vem quando tornamos as coisas fáceis, vem quando (principalmente em uma relação a dois) sentimos que ali, pode ser paz em mistura com paixão, pode ser desembaraçar no decorrer. Enfim, os quesitos estão ali, no desabafo.

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  9. Nossa, que texto incrivel! E eu realmente parei pra ler ahhahaah quase nunca faco isso! Parabens! <3 Te segui, lindo blog.
    Entao, meu primeiro cover saiu no youtube! Gostaria de te convidar para vê-lo e se inscrever no canal se gostar e falar pros migos <3 Essa ajuda seria ótima!!! Beijinhos https://www.youtube.com/watch?v=XOjBLK7UMb0&

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  10. Suas reflexões são sempre incríveis.

    Beijos
    http://orangelily.com.br/

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  11. UAU, que texto! As vezes complicamos demais aquilo que é pra ser tão simples. Tenha um ótimo dia, beijos!

    Blog Paisagem de Janela
    paisagemdejanela.blogspot.com.br

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  12. Verdade, né? Porque a gente tem que complicar tanto as coisas? Complicar tanto as nossas vidas e depois sofrer tanto por conta disso? Belo texto :)


    Beijos
    Brilho de Aluguel

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  13. Seus textos são ótimos, você tem uma ótima escrita.
    Os trechos que mais gostei e me identifiquei foram:

    "...só entre se estiver valorizando essa tal da facilidade."

    "Pode – e vai – ter um montão de montanhas, afinal, se não tiver, é porque não está olhando direito e, se não está olhando direito, é porque não está sentindo de fato. Mas tropeçamos é nas pequenas pedras. Montanha a gente escala."

    "É necessário que todas essas regras sejam espontâneas, que seja possível brigar sabendo que isso não vai ser motivo para que haja o abandono das juras."

    Lindo lindo! <3

    https://heyimwiththeband.blogspot.com.br/

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  14. Que texto maravilhoso, eu amei :D

    http://submersa-em-palavras.blogspot.com.br/

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  15. Lindo o texto! Realmente a maioria das pessoas só querem o + fácil.

    Beijos.

    Anete Oliveira
    Blog Coisitas e Coisinhas
    Fanpage
    Instagram

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  16. OI BRUNT

    você consegue trazer a realidade de um jeito muito mágico e sutil ao mesmo tempo. Não beira à irrealidade, muito pelo contrário, mas tem leveza, de fato.
    adoro a sua sensibilidade e jeito de enxergar o mundo

    beijo
    www.beinghellz.com.br

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  17. Querida Vanessa <3

    Quando começo a ler qualquer coisa escrita por ti, tudo à minha volta fica sem som, sem cor, sem tudo...
    Fico tão vidrada nas tuas letras...
    Sou tão apaixonada pela tua partilha...
    Que maravilha!

    Beijinhos grande e um Feliz Natal <3

    www.ofabulosodestinodemariaamelia.pt

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  18. Mulher, tu me matou com esse parágrafo:

    "Esse negócio de dizer que o que vem fácil, vai fácil, é um gigantesco levantar de muros, é puro embaraço. Só ocorre assim para quem não rega depois de receber a horta, para quem viu a facilidade inicial de algo como aviso de não indispensabilidade da dedicação. E, para ser fácil, de fato, é justamente o contrário requerido. O amor, só é amor, se construir fácil. A paixão, só é paixão, se voltar fácil. O talento, só é talento, se fluir fácil. O encanto, só é encanto, se nascer fácil. O prazer, só é prazer, se durar fácil. O fácil é o único tipo de pé que faz valer a caminhada nas pedras. O que pede demasiado ardor e vem com um apanhado de barreiras, só é tesouro se, no fundo, ou melhor, no caminho, desembaraçar fácil. Paciência somente para o que der paz e ciência."

    Eu estou passando por um momento difícil, bem difícil, mas seria fácil se a outra parte quisesse que fosse. Mas sabe quando a pessoa só vê empecilhos? Querer fazer dar certo, mas querer isso sozinha é muito difícil. É um momento nebuloso e esse parágrafo realmente me colocou para refletir.

    Beijos
    - Tami
    http://www.meuepilogo.com

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  19. Que texto maravilhoso Van, eu também acredito que tudo aquilo que conquistamos com suor e dedicação se torna mais prazeroso no final. Realmente você sabe usar muito bem as palavras.

    Parabéns pelo post e também pelo seu blog.

    Jacqueline Moura
    www.passeibatom.com.br

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